O conceito do eixo intestino-cérebro, uma linha bidirecional de comunicação pela qual o intestino e o cérebro mantêm a saúde em conjunto, não é novo, mas agora há evidências que sugerem que a microbiota intestinal desempenha um papel fundamental em áreas cognitivas e emocionais do cérebro. Com essas novas evidências, surgiu o novo conceito dos Psicobióticos, já que pessoas que tomam probióticos (“bactérias do bem”) sozinhos ou em combinação com prebióticos (alimentos para as nossas bactérias) podem ver uma redução nos sintomas de depressão.
“A ciência já teorizou que os comportamentos, capacidades cognitivas e até mesmo as emoções de um indivíduo podem não ser determinados inteiramente por seu sistema nervoso, mas também pela microbiota (conjunto de microrganismos) presentes no trato gastrointestinal humano. Embora esses detalhes que sustentam o funcionamento do eixo intestino-cérebro sejam complexos e ainda precisem ser totalmente elucidados, alguns estudos já mostraram que o papel dos probióticos e prebióticos na dieta, além da ação na saúde fisiológica, pode ser importante também para melhora do humor”, afirma a médica nutróloga Marcella Garcez, professora e diretora da Associação Brasileira de Nutrologia (Abran).
Um desses estudos é uma extensa revisão que foi publicada no começo de julho no BMJ Nutrition, Prevention & Health. Segundo o levantamento, dos 12 probióticos diferentes investigados, 11 eram potencialmente úteis.
“Embora os estudos sejam pequenos e breves para tirar conclusões amplas sobre probióticos ou prebióticos para a prevenção ou tratamento de transtornos de humor, os resultados mostram que é promissor e provavelmente vale a pena examinar mais a fundo os efeitos dos probióticos na depressão”, diz a nutróloga.
A microbiota intestinal pode influenciar a função cerebral por meio de vias neurais, endócrinas e imunológicas, e o cérebro pode, por sua vez, utilizar as mesmas vias para influenciar a composição da microbiota intestinal.
“Essas vias são geralmente alteradas em distúrbios psiquiátricos, segundo estudo publicado ano passado no periódico Springer Nature”, explica a médica.
Prebióticos
Segundo a Marcella, existem muitos fatores que afetam a microbiota intestinal, incluindo a dieta, que é o principal determinante da composição da microbiota intestinal em adultos saudáveis. Os probióticos são bactérias vivas que comprovadamente sustentam um microbioma intestinal saudável e, portanto, conferem um efeito benéfico à saúde do hospedeiro, quando administrados em quantidades adequadas.
“Essa nova classe de probióticos, chamada psicobiótica, atraiu a atenção de pesquisadores que estão explorando seu potencial de beneficiar a saúde mental do hospedeiro quando consumidos em quantidades adequadas. Alguns pesquisadores expandiram a definição de psicobióticos para incluir não apenas probióticos, mas também prebióticos, que são ingredientes alimentares indigeríveis no trato gastrointestinal superior, geralmente carboidratos do tipo fibras solúveis e insolúveis, que apoiam o crescimento de bactérias intestinais específicas. Frutanos (compostos presentes nas frutas) e oligossacarídeos (fibras com baixo teor de calorias) são os prebióticos mais frequentemente estudados por seus efeitos psicológicos”, explica a médica.
Vários estudos que investigam os efeitos dos probióticos em transtornos psiquiátricos descobriram que a suplementação com espécies de Lactobacillus e Bifidobacterium melhorou os sintomas de depressão.
“A composição do microbioma intestinal é, de fato, significativamente diferente em pessoas com depressão diagnosticada em comparação com controles saudáveis, embora as diferenças pareçam variar de uma pessoa para outra”, conta a nutróloga.
A pesquisa sobre os efeitos dos tratamentos probióticos para os transtornos de ansiedade é mais limitada. Animais livres de germes (ou seja, aqueles nascidos e criados em um ambiente estéril) e animais tratados com antibióticos têm demonstrado comportamentos ansiosos aumentados. Alguns estudos em humanos adultos saudáveis relataram redução do estresse e da ansiedade com a suplementação de probióticos.
No entanto, poucos estudos avaliaram os efeitos dos probióticos em pessoas adultas com transtornos de ansiedade clinicamente diagnosticados, e pesquisas adicionais são necessárias. Embora os pesquisadores tenham uma compreensão geral dos meios pelos quais os psicobióticos interagem com o cérebro, os mecanismos específicos não são bem compreendidos.
“Um mecanismo proposto envolve o eixo hipotálamo-pituitária-adrenal (HPA), o sistema neuroendócrino principalmente responsável pela resposta do corpo ao estresse. O eixo HPA regula a produção de cortisol, um hormônio imunossupressor produzido em excesso no estresse crônico que aumenta a sensibilidade às ameaças e o humor negativo. Acredita-se que a microbiota intestinal modula o eixo HPA, melhorando assim a resposta do corpo ao estresse. Outro mecanismo de ação proposto está relacionado à produção de neurotransmissores pela microbiota intestinal, incluindo serotonina e dopamina, por meio do metabolismo de fibras indigestíveis e outros alimentos prebióticos. Acredita-se que os neurotransmissores produzidos no intestino atuem diretamente sobre os neurônios e outras células do trato gastrointestinal, mas o mecanismo exato não é claro”, declara.
Além disso, segundo a especialista, é possível que os probióticos ajudem a reduzir a produção de substâncias químicas inflamatórias, como citocinas, que desempenham um papel em condições como a doença inflamatória intestinal.
“Pesquisas também especulam que probióticos ou prebióticos também podem ajudar a influenciar a atividade do triptofano, aminoácido essencial e precursor da serotonina, um importante neurotransmissor que desempenha um papel no controle do sono, apetite, impulso e nos transtornos de humor.”
Marcella ressalta que até o momento, os estudos conseguiram apenas estabelecer a existência de uma correlação entre a microbiota intestinal e a saúde mental.
“Muitos desafios, como cepas específicas de bactérias, dose e viabilidade, permanecem no entendimento do papel dos psicobióticos na saúde mental. Isso é ainda mais complicado pela falta de compreensão dos mecanismos pelos quais a microbiota intestinal e o cérebro se comunicam. Por enquanto, o conselho dietético para aqueles que sofrem de depressão deve se concentrar no consumo de uma dieta bem balanceada que inclua alimentos que contenham prebióticos e probióticos, como grãos, aveia, oleaginosas, kefir, kombucha e iogurte natural”, diz a médica.
Ainda de acordo com a nutróloga, essas descobertas são importantes para o tratamento clínico porque, “se os probióticos forem eficazes, eles têm potencial para se tornar uma ferramenta terapêutica complementar nos tratamentos para ansiedade e depressão, com pouco risco de efeitos colaterais e nenhum risco de dependência”, finaliza.
Redação Vida & Tal
Fonte: Associação Brasileira da Indústria de Alimentos para Fins Especiais e Congêneres.