Cerca de metade dos adultos hipertensos têm resistência insulínica. Este fato é bastante delicado, pois as pessoas hipertensas que apresentam resistência à insulina correm maior risco de ter um infarto ou um derrame. O problema é sério e exige cuidados especiais. Várias pessoas apresentam resistência à insulina e não sabem. Quando diagnosticada a hipertensão arterial, é importantíssimo investigar também os níveis de insulina no sangue.
O alerta é do endocrinologista Amélio de Godoy Matos, ex-presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM).
“Uma coisa é você ter um paciente hipertenso. Outra, um hipertenso resistente à insulina, que deve ser tratado diferentemente daquele que não tem a resistência. O médico precisa, obrigatoriamente, saber se o paciente hipertenso tem ou não resistência à insulina, já que, neste caso, o tratamento é muito mais severo e inclui medicamentos para melhorar o problema, ressalta o especialista.
Ainda de acordo com o endocrinologista, “a escolha de medicamentos para baixar a pressão deve recair naqueles que ajudem na melhora dessa resistência”. Entenda melhor na entrevista do médico publicada pela SBEM.
O que é a resistência à insulina?
Algumas pessoas, que têm tendência genética e que ganham peso (principalmente na região central do corpo, tórax e abdômen), podem desenvolver um defeito onde a insulina delas age menos. Dessa forma, para a mesma quantidade de insulina que elas produzem, “a queima” da glicose é menor. Isso as obriga a produzir mais insulina; daí o nome resistência à insulina.
Quais são as consequências dessa resistência à insulina?
Esse problema, geralmente, vem acompanhado de outros fatores: baixo nível do colesterol HDL (o colesterol bom), aumento dos triglicérides, aumento de alguns fatores de coagulação, níveis mais baixos do hormônio adiponectina, etc. Com isso, há risco maior de se desenvolver doenças cardiovasculares.
Através de que mecanismo a resistência à insulina pode levar à hipertensão?
Basicamente, a resistência à insulina leva a uma disfunção do endotélio da artéria, que é a camada mais interna de um vaso sanguíneo. O endotélio é um órgão endócrino em potencial. Ele produz uma série de substâncias que atuam, tanto na própria artéria como longe dela. Por isso, ele tem um componente chamado endócrino, já que é capaz de produzir substâncias que atuam localmente ou à distância.
E que substâncias são essas?
A substância mais importante que o endotélio produz é o óxido nítrico (NO), um potente vasodilatador (ele dilata a artéria). A insulina também é um potente vasodilatador, porque induz o óxido nítrico (aumenta o óxido nítrico) e, assim, favorece a vasodilatação. Na resistência à insulina, essa indução do óxido não é tão boa, causando uma diminuição da produção e da liberação do óxido. Essa diminuição da dilatação arterial favorece a hipertensão.
Além do mais, outras substâncias como a endotelina, produzida pelo próprio endotélio, são vasoconstritoras, ou seja, fazem o contrário do óxido nítrico – elas apertam a artéria. Resumindo, acontece o seguinte: o desequilíbrio entre a produção do óxido nítrico (que faz a vasodilatação) e a endotelina (que faz a vasoconstrição) vai tornando a pessoa hipertensa.
A resistência à insulina provoca hipertensão também por outros caminhos?
Sim. Por exemplo, aumenta a retenção de sódio (sal) que, por sua vez, favorece a retenção de água, aumentando o volume líquido no nosso organismo, contribuindo para o aumento da pressão arterial. Além disso, a insulina aumentada, agindo sobre uma cascata de eventos químicos dentro da célula, ativa uma enzima, a MAP-kinase, que favorece a proliferação de células no músculo liso das artérias e isso leva ao “enrijecimento” desta.
E que tipo de paciente tem mais propensão à resistência a insulina?
Pessoas com excesso de peso, maior gordura no abdômen, sedentárias, e filhos de diabéticos. A resistência à insulina é o principal defeito do diabético adulto. Cerca de 90% dos diabéticos adultos têm resistência à insulina. São, justamente, os que têm maior risco de hipertensão e de desenvolver doenças cardiovasculares, como infarto ou derrame. Só que a resistência à insulina começa bem antes do diabetes.
Sabe-se que 50% dos hipertensos têm resistência à insulina, os outros 50% se explicam por outras razões. Dados epidemiológicos sugerem a importância da resistência à insulina como mecanismo de hipertensão. Por exemplo, num estudo em crianças e adolescentes, constatou-se que aquelas que tinham maior grau de resistência à insulina foram as que desenvolveram hipertensão arterial após alguns anos de observação.
Outros estudos mostram que oito anos antes das pessoas se tornarem hipertensas, elas já têm resistência à insulina. Isso é uma prova de que a resistência à insulina começou primeiro. Foi, provavelmente, o mecanismo que levou à hipertensão, finaliza.
Redação Vida & Tal
Fonte: Entrevista concedida à Carmensita Corso/ Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia.