Além de não ser eficaz para prevenir complicações em pacientes que já possuem risco para insuficiência cardíaca, a aspirina torna-os 26% mais propensos a desenvolver o problema. Este dado preocupante é resultado do trabalho de pesquisadores da Alemanha e da Bélgica publicado na revista científica ESC Heart Failure, em novembro último.
O estudo é uma análise do projeto Homage, que reuniu dados de acompanhamento cardíaco de 46 mil pessoas nos Estados Unidos e na Europa. Para investigar o efeito da aspirina na prevenção de insuficiência cardíaca, foi utilizado um subgrupo de cerca de 30 mil pessoas, o maior até agora com essa finalidade.
Os voluntários foram acompanhados pela equipe por 5,3 anos. Neste período, 1,3 mil desenvolveram insuficiência cardíaca e precisaram de hospitalização. A idade média era de 67 anos, sendo que 34% eram mulheres.
“O uso de aspirina foi associado ao risco aumentado de insuficiência cardíaca em pacientes com ou sem histórico prévio de doença cardiovascular. Na ausência de evidências conclusivas em ensaios clínicos, nossas observações sugerem que a aspirina deva ser prescrita com cautela a pacientes sob risco de insuficiência cardíaca ou que já apresentem esse quadro”, escreveram os cientistas em artigo na revista, que pode ser lido neste link.
A incerteza sobre o uso de aspirina tem se refletido nas recomendações das diretrizes atuais, e sua utilização para prevenção primária é controversa, mesmo quando comparado com o uso em pacientes com doença cardiovascular aterosclerótica estabelecida. O uso de aspirina permanece controverso na prevenção secundária. Este é o primeiro grande estudo a investigar o papel da aspirina no risco de IC na prevenção primária e também na secundária.
Os pesquisadores reconhecem algumas limitações do estudo, como o uso de aspirina ter sido autodeclaratório, sem acompanhamento frequente. Embora não seja o primeiro trabalho a colocar dúvida sobre o uso preventivo do medicamento para cardíacos, talvez tenha sido o mais preocupante até agora. O volume de dados usados, porém, confere robustez ao trabalho.
Segundo Evandro Tinoco Mesquita, presidente do Departamento de Insuficiência Cardíaca da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), um aspecto importante é que o estudo acompanhou voluntários sem histórico de doença cardíaca, mas com fatores de risco, como tabagismo, obesidade, hipertensão e diabetes. Para o médico, seria desejável ver estudos maiores, mas como a aspirina é uma droga livre de patente, dificilmente a iniciativa privada patrocinará uma grande pesquisa.
“As próprias agências de governo têm olhado para os resultados de meta-análises e estudos que se somam e veem que cada vez menos a aspirina se encaixa nesse conceito de droga milagrosa”, declara Mesquita.
O médico explica, ainda, que no tratamento e prevenção da insuficiência cardíaca em si, é importante que cada médico avalie individualmente seu paciente para comparar o risco e o benefício da aspirina e optar pelo seu uso apenas quando for conveniente.
Importante lembrar que em outubro deste ano, um painel de especialistas dos Estados Unidos, cujos membros são escolhidos pelo diretor da Agência Federal de Pesquisa e Qualidade em Saúde do país, recomendou que pessoas com grandes chances de contrair doenças cardíacas não devem iniciar tratamentos com ácido acetilsalicílico como prevenção, devido ao risco de efeitos colaterais graves.
Anteriormente, esse mesmo painel de especialistas fez uma recomendação para adultos de alto risco (10% ou mais de chances de desenvolver um problema cardiovascular nos próximos dez anos) na faixa dos 50 anos: para tomarem aspirina infantil se suas chances de efeito colateral fossem baixas.
Agora, a recomendação é que adultos de alto risco, entre 40 e 59 anos, conversem com seus médicos sobre o risco de eventos cardiovasculares para os próximos 10 anos e conheçam seu potencial de sangramento antes de iniciar tratamento com aspirina ou caso pensem em suspender a utilização crônica de aspirina para prevenção de eventos cardiovasculares. “Pacientes que usam aspirina devido a histórico de infarto prévio, stent coronário e AVC não devem suspender sua utilização”, ressalta Mesquita.
Redação Vida & Tal
Fonte: Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC).